A alma de um déspota (se ele a tiver)



Tinha uma força por afirmar-se. Colocava-se como o centro das atenções e estava sempre certo. Não admitia correções. Se alguém, principalmente uma mulher, lhe dissesse para rever suas crenças e seus conceitos, ele simplesmente se virava e dava as costas (se não ofendesse antes).

Não ouvia. Não escutava ninguém. Era sempre o senhor-da-razão e o guardião-dos-bons-costumes, de maneira agressiva, ríspida e arbitrária. E "razão" que não tinha, "bons costumes" criados por ele mesmo. 

Ávido por poder, seguia nos caminhos das trocas de favores, dos favoritismos (prinicipalmente, por bajuladores natos). Seguia nos caminhos das sabotagens (a qualquer um que sobressaísse). Nos caminhos dos ganhos a mais em qualquer tipo de oportunidade de dinheiro fácil. Vivia no poder por ameaçar quem chegasse perto, quem dissesse qualquer coisa relativa ao seu caráter corrupto. A quem ousasse questionar: ameaçava com bilhetes anônimos ou uma arma em mãos, com os dedos no gatilho. 

Quanto aos seus próprios filhos, um detalhe: se estivesse, um deles, em situação frágil, delicada, vulnerável, o ser autoritário, de forma pérfida e para fins de inflar o próprio ego, espezinhava aquele que, fazendo parte da sua prole, incorria no erro ou era vítima de outrem. Não lhe passava pela cabeça, em hipótese nenhuma, ajudar. Ele queria ver o filho brilhar as custas do próprio esforço, o que, a princípio, pode parecer justo. Mas, no fim dos cálculos, este "brilhar pelo próprio esforço" era, nada mais, nada menos, do que sofrer, sofrer, ter o pai maltratando e pisando encima da ferida, e, por um esforço inumano, "brilhar". Sendo, "brilhar", ter muito dinheiro, ter muito poder. E, principalmente, aparência e fama que o agradasse.

Na concepção do detentor de alma déspota, era bajulado quem se enquadrava em determinados padrões físicos e de classe social. Sim. Se tivesse procedimentos estéticos, o quanto mais tivesse, seria honrada, a mulher. Se fosse de aparência nórdica, era beneficiada pelo ditador. Se tivesse um carro importado e muito poder, em detrimento de súditos sub-empregados, era considerado uma espécie de "deus".

Sendo assim, o déspota passava seus dias vilipendiando de quem ele mais precisava, negando que era ele próprio quem mais precisava dos outros. Considerava-se imbatível, auto suficiente. 

Foi assim até o dia que alguém desistiu de bajulá-lo. E é o que conta a história.





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